Como os astrônomos medem a distância até os objetos no Universo?

O Universo é de fato inimaginavelmente enorme. Mesmo em termos de nosso próprio Sistema Solar, as coisas já começam a ficar inalcançáveis. O objeto criado pelos humanos que está mais longe da Terra é a sonda Voyager 1, que mal saiu do Sistema Solar e irá alcançar a próxima estrela em seu caminho em apenas 40 mil anos. Por essas e outras que os astrônomos precisam usar meios alternativos de medir as distância até os objetos cósmicos, isto é, sem usar uma trena e coisas do tipo.

Mas um dos papéis da ciência é exatamente inovar quando o assunto é buscar informações  aparentemente inacessíveis, e portanto a astronomia pode contar com diversos métodos de medição de distâncias, alguns praticamente tão precisos quanto uma régua, e outros que se baseiam em certas propriedades dos objetos astronômicos.

Primeiro, precisamos ter uma boa definição do que é distância. A ideia é simples: quanto maior a distância entre um ponto do espaço e outro, mais tempo leva para algo se locomover de um ponto até o outro, ou equivalentemente, mais coisas cabem entre os dois pontos. Em outras palavras, a distância é uma medida numérica de quão distantes estão dois objetos, isto é, qual o tamanho do segmento de reta ligando os dois pontos. Um modo usual de medir a distância é observando quantas medidas padrões (por exemplo, uma régua) cabem entre dois objetos.

Quando as coisas ficam um pouco mais longes, podemos verificar a distância entre dois lugares (ou qual o tamanho do caminho entre eles) através do odômetros de um automóvel, por exemplo. Mas se formos aumentando ainda mais essa escala, as coisas começam a ficar interessantes.

A 'escada' cósmica de métodos de medição de distância 

Os diferentes métodos de medição de distâncias, desde os planetas do Sistema Solar às galáxias mais longínquas do Universo. Essa sucessão de métodos é conhecida como "a escada cósmica de [métodos de medição de] distâncias". Clique para ampliar. Créditos: Addyson Wesley

A escada cósmica de distâncias é a sucessão de métodos pelos quais os astrônomos determinam as distâncias até os objetos celestes. A analogia com a escada existe porque não há uma única técnica capaz de medir distâncias em todos os alcances possíveis. Algumas só funcionam com objetos próximos a nós e outras com objetos distantes. Além disso, para um método existir, um anterior foi necessário para verificar a sua plausabilidade. Entenderemos isso melhor adiante.

Vejamos agora, um a um, como funcionam os principais métodos usados para medir distância até planetas, estrelas, galáxias e outros objetos no Universo.

1. Medição por radar

Para objetos relativamente próximos a nós, como a Lua, os planetas e o Sol, a técnica usada para medir as distâncias são os radares. Através da emissão de pulsos de microondas ou ondas de rádio na direção dos objetos, analisa-se os reflexos deles para se descobrir a que distância estava aquele objeto. A potência com que o pulso retorna é igual ao inverso da quarta potência da distância. 

Foi através da medição de distâncias por radar que pode-se ter boas medidas da órbita de Mercúrio e a sua precessão, o que corroborou com a comprovação da Relatividade Geral, além de ter sido possível calcular a Unidade Astronômica (distância da Terra ao Sol) com um valor bastante refinado.

Com os radares é possível se calcular a distância até objetos dentro do Sistema Solar com uma boa aproximação. Na foto, o radar soviético Pluton, em 1960. Fonte: Creative Commons.
Com a ajuda de radares, a órbita de asteroides no Sistema Solar pode ser traçada de forma bastante precisa, e os astrônomos podem usar esses dados para prever possível impactos deles com a Terra. Com os radares é possível saber quão rápida a posição dos asteroides está mudando, ou seja, quais as suas velocidades. Além disso, informações como a refletividade e a rugosidade da superfície do objeto podem ser conhecidas, através da intensidade e forma com que as ondas retornam para a Terra.

2. Paralaxe trigonométrica


Talvez você já tenha feito uma vez na vida, mas é sempre bom recordar. Ponha um dedo na frente dos seus olhos. Primeiro, deixe apenas o olho esquerdo aberto, e verifique qual a posição aparente do seu dedo na parede ao fundo. Depois, repita com o olho direto, verificando novamente a posição do seu dedo. 

Se fez corretamente, você viu que seu dedo mudou de posição aparente ao fundo quando abriu um olho e fechou o outro e vice-versa. Isso nada mais é que a chamada paralaxe: a mudança de posição de um objeto quando visto de diferentes pontos de vista em relação aos objetos de fundo. Se você fizer a mesma coisa com o braço esticado, verá que a posição do seu dedo mudou bem menos que se ele não estivesse esticado. É exatamente por isso que os astrônomos podem usar a paralaxe para determinar a distância até as estrelas mais próximas de nós (as mais longe também sofrem paralaxe, mas ela é tão pequena que sequer conseguimos medir).

No caso da astronomia, não usamos os olhos como os dois pontos de vista para observar a paralaxe, claramente. Ao invés disso, observamos uma estrela quando a Terra está de um lado de sua órbita ao redor do Sol, e depois a observamos novamente quando a Terra está do outro lado da órbita.

Os telescópios modernos são capazes de determinar as mudanças que ocorrem na posição das estrelas no seu campo de visão ao longo do tempo. Sabendo quando pixeis uma determinada estrela se deslocou em relação às estrelas de fundo, o ângulo de paralaxe pode ser medido. Na imagem acima, ele está representado por p''. 

Usando trigonometria simples, e como sabemos que o "cateto oposto" em relação ao ângulo de paralaxe do nosso triângulo é a distância da Terra ao Sol, isto é, cerca de 150 milhões de quilômetros, determinamos a distância de nós até a estrela. Podemos usar tanto o seno quanto a tangente do ângulo de paralaxe, pois os resultados serão praticamente os mesmos. Temos então que

d = 1 UA / seno(p'')

Onde 1 UA (unidade astronômica) são os 150 milhões de quilômetros.

Os astrônomos também costumam usar a relação d = 1/p'', sendo a distância d dada em parsecs e o ângulo p'' dado em segundos de arco.

Todas as estrelas, exceto o Sol, possuem um ângulo de paralaxe menor que 1 segundo de arco, isto é, um grau divido por 3600, o que é incrivelmente pequeno. Para se ter uma ideia, a estrela (ou sistema de estrelas) mais próxima do Sistema Solar, Alpha Centauri, que está a 4,3 anos-luz de nós, possui um ângulo de paralaxe de 0.75 arcos de segundo.

As medições de paralaxes de muitas estrelas foram e ainda estão sendo feitas principalmente por dois satélites. O satélite espacial Hipparcos, que foi lançado em 1989 e operou até 1993 foi responsável por catalogar as paralaxes, além do movimento próprio (o movimento que as estrelas fazem pela galáxia) de mais de 100 mil estrelas. Seu sucessor, o satélite Gaia, foi muito além. Lançado em 2013 e ainda operante, o Gaia irá medir as posições, velocidades e paralaxes de cerca de 1 bilhão de estrelas, o que representa 1% da população total da Via Láctea. Com os dados obtidos pelo Gaia, os astrônomos serão capazes de criar um mapa tridimensional da galáxia de uma forma nunca feita antes.

Nenhum comentário